domingo, 26 de janeiro de 2014

Água

Estava deitada na grama em frente ao lago, quando vi um peixe boiar de barriga para cima. Estava morto. Fiquei o observando, perplexa com a beleza da cena. Ironicamente, o peixe morrera afogado. Cada gotícula o matou. Como veneno, a água entrou em cada barbatana e o definhou lentamente. Para onde ele iria fugir? Estava preso na sua própria vida. Fugir também seria atestar sua morte, visto que o ar lhe mataria de qualquer jeito. Pobre peixe. Viveu numa armadilha o tempo todo. Armadilha que a natureza mesma criou. Nadava para a sua liberdade mas se encontrava preso no azul. Ele teve sim seus momentos de felicidade, mas se sufocava com tanta vida. Tentava escapar e colocava a cabeça para fora d'água, mas o ar rapidamente absorvia tudo aquilo que ele tinha de bom. Ele viveu sozinho, dentro de um coral, não conversava com os outros habitantes marinhos, só saía para caçar, e mesmo assim com a esperança de ser caçado primeiro. Até que um dia ele se cansou, para falar a verdade, ele nunca pediu para nascer, viver sufocado já não dava mais. Então ele parou e deixou que a natureza agisse. O lago atendeu seu pedido, o elevando para o céu. Na água ele nasceu, na água ele viveu e na água ele ficará, para sempre.
Os olhos anestesiados,
de vista cansada de querer ver,
despertam-se aos poucos.

O vento carrega a neblina pra longe.
Da janela, descobre outros inéditos tons
agressivos, invasivos.

Lá fora é diferente...
há vida e há cor.

Ávida, se joga.
Livre, finalmente, do azul imutável
onde sempre esteve presa.

sábado, 18 de janeiro de 2014

sobre cidades

meus bolsos vazios
antes cheios de moedas doces 
plantadas em campos metálicos 
colhidas no inverno 
jogadas no ocaso 
mantidas no amargo

essa vida de trilhos
sem verde, sem folhas
estragou a terra 
e a estrada acabou.

sobre rodas e pés

essa vida de só fazer sentido na estrada
planta e colhe saudade em todos os cantos
fruto de raiz frágil e gosto amargo
única posse que cabe no bolso